sábado, 17 de maio de 2014

COMO FALAR DOS LIVROS QUE NÃO LEMOS?



COMO FALAR DOS LIVROS QUE NÃO LEMOS? Pierre Bayard, Objetiva, 207 páginas.

Leia este texto se você já leu este livro e quer saber a minha opinião a respeito. Se você ainda não o leu e não deseja ser influenciado pela minha opinião... bye, bye, baby, bye, bye, ou então siga a leitura por sua própria conta e risco ;-)



Curiosa pelo título, fui presenteada com um exemplar deste livro por uma amiga (1) e tratei de me despir o quanto possível dos preconceitos antes de abrí-lo e começar a lê-lo. No final do capítulo I eu pensei em parar, juro - e quem jura, mente; diz o dito popular -, mas alguma coisa me dizia: “Continue, continue... um livro que parece estar defendendo uma tese e, ao mesmo tempo, na prática, confirmando a sua negação. Interessante...” Então segui a leitura e foi uma ótima decisão, qualquer pessoa envolvida com livros deveria ler esse do Pierre, ainda que seja só para rir ou se reconhecer nas situações que ele expõe.

Seguindo alguns dos conselhos que estão no próprio livro: falar sobre si mesmo, adianto que aqui não falo do texto 'objeto', porém do livro ‘fantasma’, fruto da primeira leitura que fiz e influenciada pela ‘biblioteca interior’ que me forma, já empregando  parte da terminologia proposta pelo autor. E assumindo que um texto polifônico se transforma em outro a cada releitura que fazemos dele, também considerando que é grande a possibilidade de vir a tornar-se para mim um ‘livro esquecido’ com ‘opinião muito positiva’ ++,  já que é impossível lembrar-se por muito tempo de 100% de tudo o que se leu ou escreveu, a cada releitura surgirá um novo ‘fantasma’ do livro objeto-real.

Lendo superficialmente ou só ‘folheando’, como o autor convencionou usar no texto para designar tais situações, alguém (que desconheça teorias na ciência literária ou a idéia de recepção) poderia até pensar que se trata de um incentivo aos impostores - para a alegria dos preguiçosos - ou que seria um manifesto pela 'não-leitura' visando lidar com a sobrecarga de publicações do nosso tempo. E eu diria que é uma defesa sim da 'não-leitura', porém mais nos moldes daquele famoso TED de Jacob Barnett, no qual ele aconselha as pessoas a pararem de aprender e partirem para a resolução de problemas ou experimentos sem subestimar a própria capacidade de criação. 

Nesses moldes poderia dizer que Bayard estaria propondo: afastar-se da autoridade e influência dos livros impostos (do cânon por exemplo) e partir para a invenção de si mesmo, que começa pela escrita. Ok, faz todo o sentido mas, lendo nas entrelinhas, tive a impressão de que, para pensar tão livre assim, antes é preciso ter adquirido o básico, experiências e idéias; e a aquisição deste ‘básico’ é que é a questão. Ao defender a ‘não-leitura’, a meu ver, o autor poderia estar se referindo à leitura seletiva ou a manter certa distância dos livros ao exercitar o próprio pensamento ou a escolher as leituras por prazer e curiosidade e nunca para ostentar cultura ou conhecimentos que na verdade não se tem, tampouco o interesse de adquiri-los. Porém, ter optado por uma terminologia que mantém a ambuigüidade presente em toda a discussão parece estar dizendo: 

Desconfie de tudo: dos textos, do que dizem os autores, da opinião dos críticos, editores e autoridades no meio literário, das referências dadas, da sua própria interpretação, deste meu texto, de tudo;

fazendo chegar à conclusão de que para alguém tornar-se um ‘não-leitor’, antes é preciso ter desenvolvido as habilidades de um leitor crítico eficiente, alguém capaz de ler nas entrelinhas, checar a veracidade de uma informação e descartar o que não importa para os seus objetivos, alguém que sabe selecionar e que é honesto consigo mesmo a ponto de não ter vergonha de admitir que não leu este ou aquele livro, mas que nada impede de dar sua opinião sobre ele. Bom, mas esta é a minha visão e eu posso estar equivocada. 

Entendem o que eu quero dizer com ambuigüidade como pano de fundo? Não há verdades, cada página do livro leva a pensar. Será que eu li mesmo o texto de Bayard ou só folhei? O que você acha?

Ou este texto é uma crítica inteligente e bastante original à hipocrisia no que se convencionou chamar de ser culto e às engrenagens do meio literário, ou é uma paródia, ou é um ensaio filosófico-literário dos bons, escrito com muito bom humor e a propriedade de quem leva muito a sério a questão da leitura e no fundo só a incentiva. Quem sabe foi uma provocação, uma forma de questionar teorias ou propor uma nova, uma complementação. Talvez aplique a fórmula dos best-sellers ou seja um texto muito honesto, quem saberá? O mais prático é que tanto serve como um manual para ajudar a identificar impostores ou, mais nobre, como uma chamada à reflexão do papel da leitura no poder inovador individual.

Parem de aprender, parem de ler, aprendam a escutar e a inventar a si mesmos...

Mas isso só é possível quando se atinge um determinado estágio pois “(...) sem esse trabalho prévio sobre si, é igualmente impossível escutar a si mesmo nas ressonâncias íntimas que nos unem a cada obra e cujas raízes mergulham em nossa história” (página 204). Ou seja, em algum momento é necessário ter lido alguma coisa: textos ou pessoas, e precisamente. Bingo! Entendem o que estou tentando dizer? Texto gostoso, esse do Bayard!

Para encerrar, apropriando-me de um pensamento de Doris Lessing, que não reproduzo como no original usando do meu direito recém-adquirido de poder falar dos livros lidos, não-lidos ou esquecidos, sem culpas e tal, uma idéia que me marcou e agora faz parte de mim: nunca se deve ler um livro só por obrigação, pois será perda de tempo, bem como gastar anos estudando uma única obra ou um único autor, privando-se de ter um encontro tão agradável quanto ou mais até com outros livros e outros autores. E, juntando Bayard: consigo mesmo

Ah, e para falar de livros, após a leitura deste livro, confirmo o seguinte:


Ao se falar de livros deve-se lembrar que o conteúdo, no meio literário usual, sempre valerá muito menos do que as relações de poder que estão por trás desses livros enquanto produto editorial, seja pelo peso do nome do autor e/ou do editor, seja por quem apresentou o livro, escreveu nas orelhas ou mesmo quais críticos se dignaram a falar deles, bem ou mal. O único negligenciado costuma ser o leitor - ô coitado! - e sua vã opinião. Em todo caso, não devemos nos deixar enganar pela idéia de ‚autoridade’, voltemos ao texto então, deixemo-lo falar, é sempre válido ouvir o que ele tem a dizer. Tudo pode ser manipulado, exceto a impressão, que o encontro primeiro, e genuíno, com o texto, nos causou.

Como falar de livros, lidos ou não? Com honestidade.

Um texto que dá espaço a muitas idéias, como viram. Por isso é bom e eu recomendo: ler e reler. Ou seja: ler é necessário, e esse é um bom final!


Avaliação: Ótimo


P.S.: leitores pouco familiarizados com os mecanismos do universo literário e acadêmico poderão ter, deste texto, as mais diferentes visões, e isso, a meu ver, é o que o torna mais interessante. Valeu, Pierre!




(1) Lu Narbot, a autora do livro de poemas Versos ao longo do caminho e do de crônicas Uma Rede na Varanda, livro que acompanhou esse do Pierre, na foto e no pacote via-postal. Obrigada, Lu, presente lindo. Valeu!





© 2014 Helena Frenzel. Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons - Atribuição - Sem Derivações - Sem Derivados 2.5 Brasil (CC BY-NC-ND 2.5 BR). Você pode copiar, distribuir, exibir, executar, desde que seja dado crédito à autora original (Para ter acesso a conteúdo atual aconselha-se, ao invés de reproduzir, usar um link para o texto original). Você não pode fazer uso comercial desta obra. Você não pode criar obras derivadas.

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Velório sem defunto


Velório sem defunto, Mario Quintana, Editora Alfaguara, 97 páginas. Com apresentação de Fabrício Carpinejar.

O que dizer sobre este livro?? Leia-o!!! Eu amo Quintana, então sou suspeita para falar ;-)

Um pedacinho só:

"Da mesma idade

A criança que brinca e o poeta que faz um poema
- Estão ambos na mesma idade mágica!"



Avaliação: Ótimo


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quarta-feira, 7 de maio de 2014

Kindheit des Zauberers

Maravilhoso momento do primeiro encontro com um poema:

"Wieder steig ich und wieder 
In deinen Brunnen, holde Sage von einst,
Höre fern deine goldnen Lieder,
Wie du lachst, wie du träumst, wie du leise weinst.
Mahnend aus deiner Tiefe
Flüstert das Zauberwort;
Mir ist, ich sei trunken und schliefe
Und du riefest mir fort und fort..."

Hermann Hesse.

Kindheit des Zauberers, Hermann Hesse, Ein autobiographisches Märchen Handgeschrieben, illustriert und mit einer Nachbemerkung versehen von Peter Weiss. Insel Taschenbuch. 124 Seiten.




Um texto tão leve e gostoso de ler que foi uma luta interromper antes de chegar ao final. 
Com ilustrações do manuscrito original. M A R A V I L H O S O!




Avaliação: Ótimo


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Confesiones de una editora poco mentirosa




Confesiones de una editora poco mentirosa, Esther Tusquets, 236 pg, EdicionesB.

Reunião de relatos e crônicas autobiográficos relacionados ao tempo em que a autora dirigiu a editora Lumen. Aprender com a experiência alheia é sempre bom, ainda mais numa área que nos interessa, valeu muito a pena eu ter lido este livro. Fiquei curiosa pela novela que ela escreveu e por outros autores citados no livro. Li  Orquestra de verano, texto que me levou a buscar mais informações sobre a autora e a descobrir estas Confesiones. Gostei!


Avaliação: Bom


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terça-feira, 6 de maio de 2014

Nada me faltará



Nada me faltará, Lourenço Mutarelli, Cia das Letras, 136 páginas.

Adorei a capa, a ilustração é do próprio autor. É um bom livro, gostei. 

Sem dúvida a história se baseia numa ótima idéia, imprevisível o final mas... para mim... – PARA MIM, que fique bem claro -, ficou faltando alguma coisa sim, umas pitadas de força no desenvolvimento; na linguagem, que eu acho que pode (e em se tratando de literatura: deve ) ser um pouco mais profunda e trabalhada sem perder as marcas do coloquial, característica indiscutível do diálogo, aliás; ou numa mais convincente caracterização dos personagens. Sei lá, senti falta disso.

Bom, sou apenas uma pessoa que gosta de ler e falar sinceramente sobre as impressões de leitura, não sou nem pretendo atuar como crítica literária, em contexto nenhum.

Uma das frases que marquei no livro, pois muito me inspirou, foi esta: “Parece que ninguém pensa mais. Ficam só repetindo o que dizem.”

Pois é, o problema, a meu ver, não é nem pensar, o problema é ter coragem e arcar com as consequências da expressão do pensamento, não?! Eu não me esquivo... (risos!)

Leia e tire suas próprias conclusões.

Avaliação: Bom


© 2014 Helena Frenzel. Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons - Atribuição - Sem Derivações - Sem Derivados 2.5 Brasil (CC BY-NC-ND 2.5 BR). Você pode copiar, distribuir, exibir, executar, desde que seja dado crédito à autora original (Para ter acesso a conteúdo atual aconselha-se, ao invés de reproduzir, usar um link para o texto original). Você não pode fazer uso comercial desta obra. Você não pode criar obras derivadas.

sexta-feira, 2 de maio de 2014

El viento de la Luna


El viento de la Luna, Antonio Muñoz Molina, Seix Barral, Ebook.

Li este livro por causa do trabalho, ou seja: 'tive de' lê-lo. Apesar da 'obrigação' da leitura, minha relação com este livro não foi ruim, de modo algum. Eis um bom representante na literatura espanhola contemporânea dos chamados Textos de Iniciação. Sem dúvida é um bom livro, muito bem escrito, claro, pois Muñoz Molina é um autor que há muito tempo deixou de figurar entre os nobres desconhecidos e não-reconhecidos, mas a temática deste romance não está dentro das que mais têm me interessado no momento, por isso não dialogou muito comigo. Trata de problemas enfrentados pelo protagonista durante a infância e adolescência, o amadurecimento, e traz pinceladas de aspectos históricos importantes como a Guerra Civil Espanhola e a suposta chegada do homem à Lua. Rica é a memória literária do protagonista, amante de Júlio Verne e de histórias de ficção científica em geral. Vale a pena ler.

Avaliação: Bom.




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